segunda-feira, setembro 08, 2008

O Caminho

De tanto caminhar no lugar vazio e desolado, acabou por acreditar que a única realidade que existia era aquela. O que já era frio e triste tornou-se melancólico e irremediavelmente depressivo. Não sabia o que era alegria e nem imaginava o que era sorrir. Caminhou por dias, por anos, perdeu toda a humanidade que poderia ter tido no passado. Uma sombra que caminhava apenas por que não tinha uma razão para parar.
Então mais uma vez acordou...
Estava de volta naquele quarto. Levantou-se. Agora já tinha uma lembrança. Se lembrava do outro dia, quando acordara e caminhara pelo corredor. Lembrou-se do aparelho que projetava imagens. “É hora de encher minha vazia mente com algo” pensou. Caminhou até aquele aposento ao final do corredor e sentou-se. Ali começou a encher sua mente com a realidade que via. Em alguns momentos via dor e tristeza, em outras alegria e satisfação. Prazer e violência. Tudo estava ali, mesclando-se em um novo universo. Uma vida nova. Pouco a pouco, começou a enxergar isto como uma nova oportunidade, uma segunda chance. Talvez o que havia se perdido no passado fosse algo ruim, algo que não deveria de forma alguma se lembrar. Ali ganhou um nome, uma identidade, uma vida. Aprendeu que se quisesse viver ali teria que ser o que as pessoas à sua volta esperavam, e assim o fez. Não há limites para quem nada tem a perder. Não existe mentira ou verdade para quem nunca viu ou sentiu seus efeitos. E assim ele se embrenhou em um mundo de mentiras, onde se tornou aquilo que os outros gostariam que ele fosse. A cada encontro, a cada passo, menos ele era e mais era os outros em si mesmo. Mas com isso também aprendeu a manipular. As pessoas tinham sonhos, desejos, e por mais incrível que isso lhe parecesse, elas não se esforçavam para alcançá-los, tinham medo, viviam vidas vazias, sonhando com o dia em que poderiam viver uma vida verdadeira. Ele queria ter sonhos e desejos. Mas nada lhe faltava. Não esperava nada da vida, e não tinha lembranças de antes para lhe fazer alguma falta.
Durante a noite, enquanto o sono tomava seu corpo sua mente vagava pela planície deserta procurando o algo perdido de sua vida de antes. O vazio em seu coração era imenso e nada que fizesse ou que alguém fizesse era capaz de preenchê-lo.
Descobriu às falhas da vida e as falhas do mundo. Compreendia o incompreensível. Aquele que vê o mundo sem lembranças, vê o mundo de verdade. E isso lhe doía. Mas só às vezes. Às vezes nada sentia, apenas caminhava e fazia o que outros faziam para não se destacar. Ser diferente no mundo dos iguais é ruim. É doloroso. Mesmo aquele que caminha só, quer por alguns momentos fazer parte de algo, fingir que não está só.
E assim pouco a pouco misturou-se ao mundo que o adotara até que não era possível mais dizer que ele não estivera ali antes de seu despertar.
Era um alguém sem lembranças de antes, mas com muitas lembranças de agora.

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Triste, melancólico...
Consigo associar a um dia nublado, garoando, com a brisa fria balançando os cabelos... tipo isso..
Mas gostei, que virada no caracter, sera que possamos esperar q ele busque rendição após tanto envovilmento com as trevas ?!
Veremos...

;) Gostei !

3:18 PM  
Blogger Vanessa Oliveira said...

Se não tivessemos tido aquela conversa pela manhã, eu poderia supôr que essa pessoa não é você!

2:00 PM  

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