terça-feira, março 20, 2007

Justiça

Sua respiração estava irregular. Seu batimento cardíaco estava acelerado. Em toda a sua vida ele jamais se imaginara naquela situação. Mas agora era tarde para voltar atrás. Em sua mente apenas um pensamento ecoava incessantemente. Vingança... Fazia muito tempo que não dormia. Sempre que tentava, os pesadelos o assombravam a noite toda. Os gritos... O choro contido... O medo... Tudo se misturava nos pesadelos, e ele acordava suando, em desespero.
Ele olha para o instrumento em suas mãos. Antes daquele fatídico dia, jamais havia chegado perto de uma arma. Só a idéia de ver uma arma o deixava em pânico. Ana sempre debochava de seu pavor. Ana... As lágrimas corriam de seus olhos sempre que se lembrava de seu sorriso. Ana era uma boa garota. Tinha um futuro promissor. Seus pais sempre diziam com orgulho que a pequena Ana iria longe... Eles estavam enganados... Lentamente ele engatilha a arma e fica a espreita. Demorou meses para que ele descobrisse o paradeiro dos dois assassinos. E agora eles estavam ali, quase ao alcance de seu revólver, e ele se pergunta se será capaz de atirar. Ele fecha seus olhos, novamente a lembrança de Ana volta à sua mente. Mas dessa vez não de seu sorriso que ele lembra. O corpo da jovem balançando sem vida. A traquéia esmagada, o pescoço quebrado. Ele foi o primeiro a encontrá-la nesse estado. Ele tentou fazer algo, mas já era tarde demais. Ele depositou o corpo imóvel diante de si, e abraçou com força o corpo daquela que era a pessoa mais importante de sua vida. Ana estava morta... Enforcada...
O riso sarcástico o traz de volta de seus devaneios. Os dois estão ali, rindo, debochando, procurando por novas vítimas inocentes, como ele fora um dia, ele e Ana...
Não podia esperar mais, logo os dois estariam fora do alcance de sua arma. Era hora de saber se teria coragem suficiente para fazer o que era preciso. Lentamente ele saiu de seu esconderijo. Apontou a arma na direção do primeiro. O tiro saiu antes mesmo que ele se desse conta do que tinha feito. A bala atravessou as costas do primeiro, rasgou seu pulmão e saiu do outro lado, indo perder-se na noite. O primeiro caiu...
O segundo viu seu companheiro caindo, e virou-se instantaneamente.
Os olhares se encontraram. Criminoso e vítima. Mas dessa vez, os lados se inverteram. A vítima havia se tornado o criminoso, e o criminoso havia se transformado na vítima...
Ele queria dizer muitas coisas naquele momento, mas escolheu o silêncio. Caminhou na direção do homem que implorava pela vida, que chorava, dizia que era inocente...
Mas ele lembrava bem daquele rosto... Teve inúmeros pesadelos com aquele maldito rosto, que não tinha nada de inocente. Aquele mesmo homem que chorava ali diante dele, há meses atrás sorria, um sorriso malicioso e perverso.
Ele encostou o metal frio no rosto do homem.
- Não posso fazer você sofrer como me fez sofrer um dia – disse o jovem, enquanto as lágrimas escorriam de seus olhos. – Mas vou garantir que você nunca mais fará outra pessoa sofrer, como fez com a minha pequena Ana – e disparou. O projétil entrou pela maçã do rosto, cruzou o crânio e por fim rasgou a massa encefálica do homem. Seu corpo caiu quase que no mesmo instante, sem vida.
O jovem olhou para os dois ali jogados, seus corpos inertes. As lágrimas já não podiam ser contidas. Ele caiu de joelhos.
- Ana – o jovem gritou e encostou a arma contra o seu próprio queixo, disparando-a em seguida.
Seu corpo caiu ao lado dos dois que acabara de assassinar, mas ele continuava ajoelhado, olhando aquela cena.
- Estou morto? – pensou.
- Sim – uma jovem aproximou-se dele e tocou seu ombro.
No mesmo instante ele reconheceu aquela doce voz, e virou-se.
- Ana, é você? – perguntou.
- Sim – a jovem segurou as mãos do rapaz e o levantou. – Venha, está na hora de você descansar.
O jovem levantou-se e a seguiu na direção de uma intensa luz logo à frente. Eles estavam juntos de novo.

***

“Se na vida real a justiça não existe, povoemos a ficção com ela. E quem sabe, assim como o submarino de Julio Verne que um dia deixou a ficção para se tornar realidade, a justiça um dia deixe nossos livros, e se torne algo presente e real em nosso mundo”.
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Assalto seguido de Estupro ocorre no Centro-Oeste

Casal de namorados é atacado durante a noite, e tem seus pertences e carro roubado. A jovem foi estuprada na frente do namorado, que impotente foi obrigado à assistir a tudo.

Incapaz de recuperar-se de seu trauma, e sem condições de seguir com sua vida, a jovem enforcou-se dias depois do crime...
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sexta-feira, março 09, 2007

Solidão...


Lentamente seu olhar toca o céu. Aquela sensação de vazio o dominou. O tempo mostrava-se implacável. Seguia aquele caminho a tanto tempo que já havia se esquecido como é solitário. O sol brilhava naquela manhã, mas nem mesmo a beleza daquela cena era capaz de alegrar seu coração. Ele sentia-se sozinho. Mas nada que ele fizesse podia mudar isso. Sua solidão era profunda. Mesmo que houvesse pessoas ao seu lado, e havia com certeza, elas não conseguiam aplacar aquela sensação de completa solidão dele. Uma lágrima escorre e lentamente percorre seu rosto. Ele nem se dá ao trabalho de secá-la. Não se importava mais. Durante anos impediu que lágrimas escorressem, pois achava ser um sinal de fraqueza. Ele caminha pela verde grama e para diante do precipício. Ele olha para baixo. É impossível ver o fim do abismo que se abre diante dele. Ele respira profundamente. Em seu coração uma vontade de por em tudo isso um fim. Move seu pé esquerdo e brinca sobre o ar. Seria fácil. Seu tormento, sua solidão teria fim. Mas por um momento, o sol parece brilhar mais forte, e uma suave brisa toca sua face. Ele se lembra de seu caminho. Do quanto ainda há por se fazer. Do sacrifício que a ele foi destinado. Outra lágrima escorre de seus olhos. Ele vira-se, afasta-se do abismo, e caminha lentamente de volta para seu mundo. Todas as manhãs ele faz isso. Todas as manhãs ele sempre acaba voltando para o seu triste e solitário caminho. E mais uma vez enquanto se afastava ele não percebeu os dois seres que desciam do céu e paravam diante do precipício. Os dois seres sorriam enquanto observavam ele se afastando. Ele não sabia, e talvez jamais saberá, mas em toda a sua vida desde que começara a trilhar este caminho, ele nunca esteve sozinho...
Knockin' on Heaven's Door

Mama, take this badge off of me
I can't use it anymore.
It's gettin' dark, too dark to see
I feels I'm knockin' on heaven's door.

Knock, knock, knockin' on heaven's door
Knock, knock, knockin' on heaven's door
Knock, knock, knockin' on heaven's door
Knock, knock, knockin' on heaven's door

Mama, put my guns in the ground
I can't shoot them anymore.
That long black cloud is comin' down
I feels I'm knockin' on heaven's door.

Knock, knock, knockin' on heaven's door
Knock, knock, knockin' on heaven's door
Knock, knock, knockin' on heaven's door
Knock, knock, knockin' on heaven's door
Bob Dylan